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domingo, 8 de novembro de 2009

ISLAM ACONTECE NA EUROPA

Islão na Europa

Os suíços têm medo dos minaretes e não são os únicos na Europa

08.11.2009 - 12:46 Por Sofia Lorena
O cartaz do SVP mostra uma bandeira suíça de onde saem minaretes em forma de mísseis atrás de uma mulher de chador
Uma torre não é só uma torre, quer se erga no cimo de um castelo, de uma mesquita ou de uma igreja. Um minarete não é nem nunca foi só uma torre. Na Europa, tem-se tornado num dos símbolos de tensão entre grupos de não muçulmanos, que vêem os crentes do islão como estranhos à sua cultura e identidade, e comunidades muçulmanas que, cada vez mais integradas e orgulhosas, querem dar visibilidade aos seus templos.


Os 400 mil muçulmanos da Suíça têm 180 locais de culto, a maioria em edifícios industriais ou salas, "soluções improvisadas sem representatividade exterior, longe dos bairros simpáticos", diz Andreas Tunger-Zanetti, do Centro de Investigação em Religião da Universidade de Lucerne. Só há quatro mesquitas com minaretes no país e em nenhum local de culto se ouve o muezzin, a chamada para a oração.

Mas, nos últimos anos, os muçulmanos de pequenas cidades da Suíça alemã decidiram pedir autorização para construir novas mesquitas com minaretes. Primeiro, alguns habitantes começaram a recolher assinaturas contra as torres. Depois, o Partido do Povo Suíço (SVP) resolveu coordenar uma campanha nacional. Como na Suíça 100 mil assinaturas chegam para convocar um referendo, no dia 29 os eleitores serão chamados a votar. Se disserem "sim", a frase "a construção de minaretes é proibida" será acrescentada à Constituição, a mesma que prevê a liberdade religiosa.

As sondagens dão vantagem ao "não" - 51 por cento contra 35 por cento -, mas o debate e as suas potenciais cicatrizes estão para ficar.

Os promotores da campanha descrevem as torres como símbolo da "intolerância islâmica". "Se queremos impedir a sharia [lei islâmica], temos de proibir os minaretes", explicou Walter Wobmann, um deputado do SVP, citado na imprensa local.

Em causa, portanto, não estão os muçulmanos, mas a sua aparente determinação em islamizar a Suíça, sustentam. Tunger-Zanetti também não acredita que a questão tenha a ver com a presença de muçulmanos, mas com a tomada de consciência de que o islão não está de passagem: "A construção de um minarete indica que a comunidade vai ficar. É isso que a sociedade suíça só agora está a perceber", disse ao PÚBLICO.

Num estudo intitulado "Conflitos sobre Mesquitas na Europa", promovido pela Network of European Foundations e dirigido pelo sociólogo Stefano Allievi, conclui-se que nos últimos 20 anos as mesquitas (ou os minaretes) geraram "cada vez mais e mais frequentes disputas, mesmo em países onde estes conflitos não existiam e as mesquitas já estavam presentes".

Isso acontece independentemente da relação de cada país com o islão - nas nações onde o islão chegou nos seus primeiros séculos, nos países que colonizaram nações muçulmanas ou naqueles onde o islão quase só chegou através da imigração, no século XX.


Os conflitos crescem, "mesmo em países onde o processo de inclusão já fez mais caminho"
, escreve Allievi. Muitas vezes, os aspectos questionados não são visíveis ou sequer existentes nos países em que estas tensões irrompem. Diferentes acontecimentos, fruto de fundamentalismos mais ou menos locais, tornaram-se tema global. A fawta (édito religioso) contra Salman Rushdie veio do Irão, os cartoons de Maomé provocaram protestos em países muçulmanos, alguns suicidas do 11 de Setembro viviam na Europa, Theo van Gogh foi assassinado na Holanda, houve ataques em Londres e Madrid, o hijab (lenço islâmico) foi debatido até onde é pouco comum.

Na Suíça, sustenta Tunger-Zanetti, os promotores da campanha antiminaretes alimentam-se "de um desconforto generalizado com alguns fenómenos associados, correcta ou incorrectamente, ao islão, como as burqas, a repressão das mulheres, a intenção de expandir a influência muçulmana". Para o conseguir, explica, "insinuam episódios ou estatísticas de países europeus ou muçulmanos, mas a cadeia de "provas" é tão fraca que não pode ser encarada como um argumento". É, "na verdade, uma expressão desse desconforto e da incapacidade que muitas pessoas têm em encontrar o seu espaço numa sociedade multicultural e multirreligiosa".



Nós e eles

As mesquitas, mais do que as mulheres de hijab que passam na rua, ficam. Os minaretes erguem-se acima de outros pontos. "O controlo do território e sobre o território não é só um facto cultural e simbólico, é também um sinal muito concreto e material de domínio e poder", escreve Stefano Allievi. O italiano conclui que neste momento da história as mesquitas produzem quase sempre conflitos induzidos por um reflexo de identidade - uma dinâmica de "nós/eles" - e que essa reacção não se verifica quando em causa estão igrejas de uma confissão diferente da dominante, sinagogas ou templos de outras religiões.

Inevitavelmente, quase todos os conflitos a propósito das mesquitas na Europa incluem "a questão do minarete, a sua altura ou a sua própria existência". O minarete, "como os arranha-céus ou a Torre de Babel, é um símbolo que se eleva no céu, um símbolo de poder, dimensão e força".

O arqueólogo Cláudio Torres lembra que "desde os zigurates na Babilónia" se valorizava "esse elevar-se, esse subir aos céus, às casas dos deuses, e por outro lado, esse marcar de poder".

Se o cristianismo inicial, uma "religião da salvação contra os poderosos", não tinha torres e era "virado para dentro", já "o mundo muçulmano surge numa época de expansão do proselitismo que passava por se mostrar". Com o feudalismo, o cristianismo torna-se religião de poder na Europa. E enquanto no mundo cristão "surgia uma torre cada vez mais afilada", a torre, "essa coisa alta e visível, onde os cristãos puseram o sino e os muçulmanos o muezzin", tornava-se no símbolo desta espécie de frente a frente. "À medida que as religiões se confrontavam, começou a confrontação das torres", diz Cláudio Torres.

Na Europa de hoje, "o minarete tornou-se no símbolo por excelência do conflito que rodeia o islão, ou a sua visibilidade - mais do que o hijab", sustenta Allievi. Para uns, é um símbolo de integração; para outros, uma demonstração inaceitável de poder.



Porcos e leis

Em Colónia, na Alemanha, onde uma iniciativa da extrema-direita contra uma mesquita desencadeou protestos e contra-manifestações em 2007, vai nascer um minarete de 55 metros,. menos cinco do que os 60 da torre do sino da catedral.o minarete foi reduzido a metade Em Los Bermejales, Espanha, Em Driebergen, Holanda, dois foram retirados após negociações com a câmara.

Em 2008, a Caríntia foi a primeira região da Áustria a aprovar uma lei que baniu os minaretes. Seguiu-se Voralberg. Outras regiões austríacas, mas também alemãs e suíças, pediram cópias da legislação.

Em Itália, dos 660 locais de culto, só três são verdadeiramente mesquitas, reconhecíveis como tal. No Norte do país, a oposição ao islão tem sido assumida pela Liga Norte: o ano passado, membros do partido levaram um porco a passear no local onde estava planeada a construção de uma mesquita, em Pádua, e o ministro Roberto Calderoli chegou a propor um "dia do porco" para protestar contra a mesquita. Manifestações semelhantes tiveram lugar na Áustria e na Suécia.

No caso dos minaretes, muitas vezes as comunidades muçulmanas acabam por aceitar diminuir a sua altura ou abdicam tranquilamente da sua construção. Como acontece com o chamamento para a oração, que quase nem chega a ser reivindicado. Em todo o caso, apesar de as leis de excepção só existirem até agora em duas regiões austríacas, o estudo de Allievi confirma que os muçulmanos tendem a ser vistos como tão "diferentes" que para uma parte da população europeia não faz sentido que as leis e as regras que se aplicam para todos lhes sirvam.

Na Suíça, mais do que os próprios muçulmanos, têm sido membros de outras religiões a falar em nome deles na defesa dos minaretes. "Os líderes da comunidade concordaram muito cedo em não dar início a uma contra-campanha. Sentem que os promotores da iniciativa tentaram provocá-los", diz Andreas Tunger-Zanetti. "Consideram, e penso que têm razão, que este debate pertence à maioria da sociedade e é sobre princípios de tolerância e liberdade de crença."

http://www.publico.clix.pt/Mundo/os-suicos-tem-medo-dos-minaretes-e-nao-sao-os-unicos-na-europa_1408904

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